CONSELHO TUTELAR

Cartilha 30 anos do Estatuto da Criança e do Adolescente. Publicado em 2020 - DPD/UFV 

Escrito por Profa. Luciene Colli Rinaldi

Em colaboração com Camila Alvim e Kaio Russo de Oliveira Costa

O Conselho Tutelar é um órgão de defesa dos direitos, criado pelo Estatuto da Criança e do Adolescente. É composto por membros da sociedade civil, encarregado de zelar pelo cumprimento e defesa dos direitos infanto-juvenis com independência e autonomia em suas decisões. De acordo com a Resolução no 113 do CONANDA, o Conselho Tutelar é órgão integrante do Sistema de Garantia de Direitos de Crianças e Adolescentes e suas decisões têm eficácia plena, passíveis de execução imediata.

Disciplinado no ECA, assim se encontra definido: 

Art. 131. O Conselho Tutelar é órgão permanente e autônomo, não jurisdicional, encarregado pela sociedade de zelar pelo cumprimento dos direitos da criança e do adolescente, definidos nesta Lei.

A criação e composição dos Conselhos Tutelares é feita pelo CMDCA, que também conduz o processo de escolha de seus integrantes. Em cada município deverá haver, obrigatoriamente, no mínimo 01 Conselho Tutelar, composto por 05 cidadãos eleitos pelo voto direto, facultativo e secreto, para o exercício do mandato por 04 anos, permitida a recondução.

A Resolução no 170 do CONANDA dispõe sobre o processo de escolha dos Conselheiros, o funcionamento do Conselho Tutelar e sua articulação com os demais órgãos, visando a promoção dos direitos de crianças e adolescentes. De acordo com o CONANDA, a atuação do Conselho Tutelar deve ser voltada à solução efetiva e definitiva dos casos atendidos, com o objetivo de desjudicializar, desburocratizar e agilizar o atendimento das crianças e dos adolescentes. No entanto, o caráter resolutivo da intervenção do Conselho Tutelar não impede que o Poder Judiciário seja informado das providências tomadas ou acionado, sempre que necessário.

ATRIBUIÇÕES DO CONSELHO TUTELAR

O Estatuto da Criança e do Adolescente, ao criar os Conselhos Tutelares, atribuiu-lhes a função de zelar pelo cumprimento dos direitos das crianças e dos adolescentes os municípios através da aplicação das medidas de proteção quando os direitos forem ameaçados ou violados por ação ou omissão da sociedade, ou do Estado, por falta, omissão ou abuso dos pais ou em razão de sua conduta, como dispôs o art. 98 do ECA. As decisões do Conselho Tutelar devem ser coletivas e sempre debatidas, avaliadas e referendadas por seus membros que, no exercício de suas atribuições, deverão observar a condição de crianças e adolescentes como sujeitos de direitos e destinatários da proteção integral e prioritária.

Em sua atuação e, no âmbito das atribuições do conselheiro tutelar devem prevalecer os princípios da intervenção precoce, antecipando-se na tomada de decisões em que deva prevalecer o melhor interesse da criança, compreendendo que a intervenção mínima das autoridades e instituições na promoção e proteção dos direitos da criança e do adolescente é a melhor forma de resguardar-lhes os direitos e sua proteção integral.

Em sua atuação, deverá manter o respeito à intimidade e à imagem da criança e do adolescente tendo sempre em vista que, em sua intervenção, deverão ser adotadas medidas adequadas, proporcionais e efetivas que a incentivar a responsabilidade parental com a criança e o adolescente, privilegiando as ações que os integrem à sua família natural ou extensa, ou ainda em sua família substituta. Medida importante na efetiva garantia de direitos é a previsão contida na Resolução no 170 do CONANDA, que torna obrigatória a oitiva e a participação da criança e o adolescente nos atos e na definição da medida de promoção dos direitos e de proteção, de modo que sua opinião seja devidamente considerada, prevalecendo assim o princípio de que o melhor interesse de crianças e adolescentes deverá ser sempre assegurado.

Art. 32 - [...] XII - oitiva obrigatória e participação da criança e o adolescente, em separado ou na companhia dos pais, responsável ou de pessoa por si indicada, nos atos e na definição da medida de promoção dos direitos e de proteção, de modo que sua opinião seja devidamente considerada pelo Conselho Tutelar.

Nas ações do Conselho Tutelar, havendo intervenção a impedir a violação de direitos, será obrigatória a informação à criança e ao adolescente, respeitada sua idade e capacidade de compreensão, assim como aos seus pais ou responsável, acerca dos seus direitos, dos motivos que determinaram a intervenção e da forma como se processa.

Depreende-se que, em todas as ações do Conselho Tutelar, deve prevalecer o princípio do melhor interesse de crianças e adolescentes, realizando-o pela municipalização das ações e integrando de maneira coordenada, a família, a sociedade e o Estado, buscando a efetivação da proteção integral e prioritária que a Constituição Federal assegurou.

As atribuições do Conselho Tutelar estão relacionadas no art. 136 do ECA. Contudo, este rol não é exaustivo mas sim exemplificativo porque, sempre que houver violação ou ameaça de violação de direitos, serão legítimas as ações que visem fazer cessá-las, abrangendo o atendimento, a promoção, encaminhamentos, representação junto à autoridades, assessoramento ao Poder Público, requisição a qualquer órgão, dentre outras, da seguinte forma:

Art. 136. São atribuições do Conselho Tutelar:

I - atender as crianças e adolescentes nas hipóteses previstas nos arts. 98 e 105, aplicando as medidas previstas no art. 101, I a VII;

II - atender e aconselhar os pais ou responsável, aplicando as medidas previstas no art. 129, I a VII;

III - promover a execução de suas decisões, podendo para tanto:

a) requisitar serviços públicos nas áreas de saúde, educação, serviço social, previdência, trabalho e segurança;

b) representar junto à autoridade judiciária nos casos de descumprimento injustificado de suas deliberações.

IV - encaminhar ao Ministério Público notícia de fato que constitua infração administrativa ou penal contra os direitos da criança ou adolescente;

V - encaminhar à autoridade judiciária os casos de sua competência;

VI - providenciar a medida estabelecida pela autoridade judiciária, dentre as previstas no art. 101, de I a VI, para o adolescente autor de ato infracional;

VII - expedir notificações;

VIII - requisitar certidões de nascimento e de óbito de criança ou adolescente quando necessário;

IX - assessorar o Poder Executivo local na elaboração da proposta orçamentária para planos e programas de atendimento dos direitos da criança e do adolescente;

X - representar, em nome da pessoa e da família, contra a violação dos direitos previstos no art. 220, § 3o, inciso II, da Constituição Federal;

XI - representar ao Ministério Público para efeito das ações de perda ou suspensão do poder familiar, após esgotadas as possibilidades de manutenção da criança ou do adolescente junto à família natural.

XII - promover e incentivar, na comunidade e nos grupos profissionais, ações de divulgação e treinamento para o reconhecimento de sintomas de maus-tratos em crianças e adolescentes.

MEDIDAS DE PROTEÇÃO APLICÁVEIS PELOS CONSELHEIROS TUTELARES

As medidas de proteção são aquelas que, destinadas à proteção de crianças e adolescentes quando forem violados seus direitos, são aplicáveis pelo Conselho Tutelarou pela Autoridade Judiciária, como assegurou o art. 98 do ECA. Em sua aplicação, serão observadas as necessidades psicológicas das crianças e adolescentes, buscando o fortalecimento dos vínculos familiares e comunitários, observando a condição de sujeitos de direitos destinatários de proteção prioritária e integral à vista da superioridade dos direitos que detém.

É no art. 100 do ECA que está prevista a responsabilidade do poder público como primária e solidária, nas 3 esferas de governo, para a efetivação dos direitos assegurados a crianças e adolescentes. Este atendimento deverá se realizar através da sua municipalização, pela intervenção precoce, proporcional, atual e adequada para a situação de perigo que crianças e adolescentes se encontrem no momento em que a decisão for tomada.

No entanto, reforçando a proteção constitucional assegurada à família, por compreender o Estado que ela é a base da sociedade, toda intervenção a ser realizada primará pela responsabilidade parental para que assumam seus deveres para com crianças e adolescentes.

São as seguintes medidas de proteção que o ECA previu:

Art. 101. Verificada qualquer das hipóteses previstas no art. 98, a autoridade competente poderá determinar, dentre outras, as seguintes medidas:

I - encaminhamento aos pais ou responsável, mediante termo de responsabilidade;

II - orientação, apoio e acompanhamento temporários;

III - matrícula e frequência obrigatórias em estabelecimento oficial de ensino fundamental;

IV - inclusão em serviços e programas oficiais ou comunitários de proteção, apoio e promoção da família, da criança e do adolescente;

V - requisição de tratamento médico, psicológico ou psiquiátrico, em regime hospitalar ou ambulatorial;

VI - inclusão em programa oficial ou comunitário de auxílio, orientação e tratamento a alcoólatras e toxicômanos;

VII - acolhimento institucional;

VIII - inclusão em programa de acolhimento familiar;

IX - colocação em família substituta.

O acolhimento institucional e o acolhimento familiar são medidas provisórias e excepcionais, utilizáveis como forma de transição para reintegração familiar ou, não sendo esta possível, para colocação em família substituta, não implicando privação de liberdade.

O afastamento da criança ou adolescente do convívio familiar (incisos VII, VIII e IX do art. 101) é de competência exclusiva da autoridade judiciária e importará na deflagração, a pedido do Ministério Público ou de quem tenha legítimo interesse, de procedimento judicial contencioso, no qual se garanta aos pais ou ao responsável legal o exercício do contraditório e da ampla defesa.

A PRÁTICA DO ATO INFRACIONAL E A ATUAÇÃO DO CONSELHO TUTELAR E DA JUSTIÇA DA INFÂNCIA E JUVENTUDE

O ato infracional é medida análoga ao crime, praticado por adolescente e passível de aplicação das medidas de proteção e socioeducativas previstas no Estatuto da Criança e do Adolescente. Por não serem destinatários da norma penal em virtude de sua inimputabilidade, menores de 18 anos não se submetem à aplicação da pena como os adultos em razão estarem em fase de desenvolvimento físico e mental e, por isto, suscetíveis às violações de direitos, demandando por proteção, socialização e educação, e não de punição.

Sob este entendimento, que está de acordo com o princípio da proteção integral que deve prevalecer em todas as ações da família, da sociedade e do Estado, o Estatuto da Criança e do Adolescente disciplinou o procedimento para a apuração do ato infracional restringindo a atuação do Conselho Tutelar na aplicação das medidas de proteção e, ao Judiciário, a aplicação das medidas socioeducativas após o devido processo legal junto à Justiça da Infância e Juventude. Segundo o ECA, nenhum adolescente em situação de ato infracional, será privado de sua liberdade sem o devido processo legal, ressalvadas as hipóteses de apreensão em flagrante de ato infracional ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente. Aos adolescentes a que se atribua a prática de ato infracional, são assegurados os seguintes direitos e garantias:

Art. 111. São asseguradas ao adolescente, entre outras, as seguintes garantias:

I - pleno e formal conhecimento da atribuição de ato infracional, mediante citação ou meio equivalente;

II - igualdade na relação processual, podendo confrontar-se com vítimas e testemunhas e produzir todas as provas necessárias à sua defesa;

III - defesa técnica por advogado;

IV - assistência judiciária gratuita e integral aos necessitados, na forma da lei;

V - direito de ser ouvido pessoalmente pela autoridade competente;

VI - direito de solicitar a presença de seus pais ou responsável em qualquer fase do procedimento.

Fica evidenciado que, enquanto destinatários da proteção especial e prioritária, adolescentes em situação de ato infracional gozarão de igualdade de direitos na relação processual, em respeito ao devido processo legal, à presunção da inocência e da ampla defesa.

A JUSTIÇA DA INFÂNCIA E JUVENTUDE

A Justiça da Infância e Juventude apurará a prática de ato infracional e sua competência está delimitada no art. 148 do ECA, especialmente para aplicar as medidas socioeducativas (inciso I), dentre outras importantes competências, assim previstas:

Art. 148. A Justiça da Infância e da Juventude é competente para:

I - conhecer de representações promovidas pelo Ministério Público, para apuração de ato infracional atribuído a adolescente, aplicando as medidas cabíveis;

II - conceder a remissão, como forma de suspensão ou extinção do processo;

III - conhecer de pedidos de adoção e seus incidentes;

IV - conhecer de ações civis fundadas em interesses individuais, difusos ou coletivos afetos à criança e ao adolescente, observado o disposto no art. 209;

V - conhecer de ações decorrentes de irregularidades em entidades de atendimento, aplicando as medidas cabíveis;

VI - aplicar penalidades administrativas nos casos de infrações contra norma de proteção à criança ou adolescente;

VII - conhecer de casos encaminhados pelo Conselho Tutelar, aplicando as medidas cabíveis.

Todos os processos e procedimentos afetos à Justiça da Infância e Juventude terão tramitação prioritária e o Ministério Público exercerá a função de fiscalizar a sua realização, primando pela garantia da realização dos atos com estrita legalidade e sob o manto da Doutrina da Proteção Integral. São abolidas as ações paternalistas, que dão lugar às ações que operacionalizam a Proteção Integral no âmbito do Judiciário, cumprindo as diretrizes da ONU contidas na Declaração Universal dos Direitos da Criança de 1959, da qual o Brasil foi signatário.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ATRIBUIÇÕES do conselho tutelar. Ministério Público do Estado do Paraná – MPPR, Curitiba, PR, [entre 2000 e 2020]. Disponível em: <http://crianca.mppr.mp.br/pagina-1835.html>. Acesso em: 10 de set. de 2020.

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil, Brasília, DF: Senado Federal: Centro Gráfico, 1988. pp. 132.

BRASIL. Lei no 8.069, de 13 de julho de 1990. Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente e dá outras providências. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 16 jul. 1990. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L8069.htm>. Acesso em: 05 de set. de 2020.

CERQUEIRA, Thales Tácito. Manual do Estatuto da Criança e do Adolescente (teoria e prática). 2a edição. Niterói, RJ: Impetus, 2010.

CONSELHO Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (CONANDA). Gov.br.Brasil, atualizado em 04 de set. de 2018. Disponível em: < https://www.gov.br/mdh/pt-br/acesso-a-informacao/participacao-social/conselho-nacional-dos-direitos-da-crianca-

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ESTATUTO da criança e do adolescente (ECA). Educa Mais Brasil, Brasil, 2020. Disponível em: <https://www.educamaisbrasil.com.br/enem/historia/estatuto-da-crianca-e-do-adolescente-eca>. Acesso em: 10 de set. de 2020.

FUNDAÇÃO abrinq pelos direitos da criança e do adolescente. Guia para ação passo a passo.2a edição. São Paulo: Nywgraf Editora Gráfica Ltda, 2015.

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